19.11.08

CRESCER É MESMO NECESSÁRIO?

Decrescimento sustentável é a ousada tese do francês Serge Latouche para diminuirmos a devastação dos recursos naturais do planeta

(texto: Igor Olszowski)

As idéias do economista e filósofo francês Serge Latouche se chocam com o estilo de vida dos habitantes das grandes cidades do mundo. Professor emérito da Faculdade de Economia da Universidade Paris XI e do Instituto de Estudos do Desenvolvimento Econômico e Social (Iedes), Latouche, 68 anos, critica vorazmente o crescimento econômico promovido pelos estados. Defende com ardor uma suposta “descolonização” do nosso imaginário e uma mudança de comportamento mais ativa para salvar o planeta do esgotamento de recursos naturais.

O ritmo anda acelerado e estamos consumindo demais, acredita o pensador, que construiu nas últimas décadas toda uma crítica contra a ocidentalização do mundo. Latouche é um dos principais porta-vozes do movimento pelo decrescimento. Tem vários livros e artigos publicados sobre o tema, inclusive no Brasil. Mas, apesar da visão aparentemente trágica, assume-se como um otimista e acredita na vontade da juventude de viver num mundo melhor.

Como o senhor define o decrescimento sustentável?
Criamos esse slogan em 2002 para ir de encontro ao que todos falavam na época sobre o crescimento sustentável. Era preciso marcar uma ruptura radical, porque o crescimento não é durável. Por isso, nós buscamos esta palavra provocadora: decrescimento. O crescimento pelo crescimento ninguém acha absurdo. Então o decrescimento força as pessoas a pensar: “O que isso quer dizer?” Quando falamos em decrescimento, falamos em sair de uma religião do crescimento ligada à economia e ao progresso.

É possível alterar essa lógica?

O relatório do Clube de Roma de 1972 já dizia que uma sociedade de crescimento não era sustentável. Muitos sociólogos e filósofos mostraram que ela não era nem mesmo desejada. Como as ameaças se aproximam, torna-se mais visível. O projeto de uma sociedade de decrescimento não é uma alternativa, e sim a libertação de uma ditadura econômica para reinventar um futuro sustentável. Uma sociedade não pode sobreviver se não respeitar os limites dos recursos naturais. Eu proponho um ciclo virtuoso do decrescimento: reavaliar, reconceitualizar, reestruturar, redistribuir, relocalizar, reutilizar e reciclar. Os dois primeiros termos são importantes para colocar em questão os valores comuns em nosso imaginário. Reconceitualizar é mudar nossa maneira de pensar. É uma verdadeira revolução cultural.

Mas como iniciar a mudança?
Precisamos renunciar a essa atitude predadora, ter uma mudança de atitude mental. Não somente um comportamento individual e sim o produto de um sistema. Muita gente já está convencida de que não é preciso destruir todas as espécies para ganhar mais. Entretanto, são forçados pela lógica do mercado, pela concorrência e pelo marketing. Vamos então mudar de programa para depois trocar de computador. Alterar a base de produção e torná-la mais adequada às necessidades do meio ambiente. Buscar a reutilização, a reciclagem.

Nosso ritmo está muito acelerado?
Com certeza. É necessário dar um basta ao consumo excessivo. Não é somente uma ação individual – porque, se apenas reduzo meu consumo, isso não mudará muito. Temos que mudar o modo de produzir as coisas. Você pode comer um bife em que o gado é criado em pastos naturais ou um bife de uma fazenda que obedece à lógica de mercado. No último caso, você come petróleo. Ele incorpora 6 litros de petróleo. Como isso é possível? O gado é alimentado com a soja que é plantada na Amazônia. Os tratores destroem as florestas, fazem a plantação e despejam os pesticidas. Tudo isso é petróleo. Devemos colocar esse sistema em causa, e não o fato de comermos um bife.

Seremos realmente mais felizes se consumirmos menos?
O consumo traz cada vez menos a felicidade. Vários indícios provam isso. Muitos estudos apontam para o aumento de suicídios e a utilização de antidepressivos. O estresse tornou-se um problema grave em nossa sociedade. Mas ao mesmo tempo somos viciados nesse estilo de vida. Necessitamos de uma terapia.

O mercado de produtos orgânicos indica uma mudança de comportamento?
Aqui na França, as grandes cadeias de supermercados já têm uma linha própria de produtos orgânicos e provenientes do comércio responsável. Essa tomada de consciência é importante porque um dos aspectos destrutivos do meio ambiente é a agricultura produtivista. Tudo o que seja uma alternativa a isso é benéfico. A produção familiar e sem pesticidas é uma das condições para um futuro sustentável.

Mudar a matriz energética pode ser uma das vias de solução?
Como dizia a ministra do Meio Ambiente da República Checa: “Quando há uma inundação no banheiro, você pode secar com um pano de chão. O que eu faço de imediato é fechar a torneira.” Enquanto não decidirmos limitar o consumo de energia, todas as soluções de energia renovável não servirão para muita coisa. A primeira coisa a fazer é fechar a torneira.

A geração de agora é capaz de fazer essa transformação?
Em teoria, ela deveria ser menos capaz. Ela já está mais pervertida. O grande problema está na educação. Quais crianças deixaremos no mundo? Como nós deixamos às nossas crianças um mundo estragado, nós deixamos também para o mundo uma geração pervertida. Apesar de tudo, ainda há uma luz de esperança. Vejo uma participação crescente de jovens no movimento pelo decrescimento sustentável em vários países da Europa. Eles se organizam, tomam iniciativas. Eles querem viver num mundo melhor, salvar a humanidade e o planeta.

E qual seria então a mensagem do decrescimento?
A mensagem não é somente reduzir o excesso de consumo e os danos ecológicos, mas também reduzir a quantidade de trabalho. Não é trabalhar menos para ganhar mais. É trabalhar menos para que todos possam trabalhar e viver melhor. Assim, teremos mais tempo livre para gastar com coisas que realmente valem a pena. Escutar música, dançar, jogar, pensar ou mesmo não fazer nada. Mas, ao contrário, nós nos tornamos viciados no trabalho. Os americanos inventaram a palavra workaholic. Nós quase precisamos de um curso de desintoxicação para reaprender a viver. E, nesse ponto de vista, o decrescimento é uma arte de viver.

Bruno Pessa concorda com a mensagem do decrescimento. Vc naum?

3 comentários:

Anônimo disse...

Aprova aí cuzão....
O título e o termo "decrescimento" parecem mais revolucionários do que o texto em si mostra (não sei dos livros e artigos do cara).

Pô, que ninguém precisa de celular com câmera, e-mail, MP3, notícias do Palmeiras, chat pornô, etc....todo mundo sabe, mas todo mundo compra essas porra.

Que a maioria das porcarias que compramos não serve pra nada além de nos matar e matar o planeta, já sabemos...acabei de comer um hamburguer horrível (supostamente de picanha, se pá, tinha mais gosto de petróleo mesmo).

O negócio é: como promover emprego sem crescimento (do jeito que é hoje....aumento de produção pra estancar a sangria voraz por coisas desnecessárias)? Como uma empresa X vai contratar mais se não tiver que aumentar a produção, que em algum ponto depende de um idiota comprando alguma coisa de que não precisa?

Porque um cara estuda pra caralho, se forma e depois trampa um monte pra no final de semana sair com amigos idiotas, falar asneiras, comer porcarias, mostrar a bosta do carro novo...sei lá. Ninguém sabe o que é felicidade e porque a gente faz as coisas...ninguém pensa no que faz. Se o que pode promover a mudança na maneira de aproveitar o mundo sem ferrá-lo é nossa capacidade de perceber o que nos torna realmente felizes, estamos todos condenados!

Sei que parece coisa de gente que está viciada na maneira atual de se viver, mas o período transitório é tão importante quanto o permanente da nova condição....afinal de contas, vai levar uns 150anos pra mudar e eu não tenho esperança de viver mais do que 40, os caras de branco do dedo comprido não me pegam!

Bruno Pessa disse...

Aprovado, cuzão...
O emprego pode surgir à medida que as pessoas empregadas troquem de trabalho ou sejam demitidas ou se aposentem, coisas que acontecem todo dia, não?

Anônimo disse...

Se a gente pensar bem...crescimento econômico nem hoje resolve o problema da falta de emprego...sempre vai ter uma margem de pessoas fudidas. Crescimento resolve hoje o meu emprego, mas quem sabe por quanto tempo.
Se a gente pensar numa economia em que o número de vagas de emprego é exatamente o número de pessoas que precisam de emprego, ela precisa crescer?
Ainda imaginamos que todas formas de produção de bens, energia, informação, etc não tem qualquer impacto no meio ambiente e na saúde das pessoas. Como é a vida?

Me torrou pra comentar, agora aguente a ignorância (das idéias e do tamanho do comentário)!